Ariano Suassuna: breve história de uma trajetória autêntica – Da Paraíba para o Brasil

Tenho duas armas para lutar contra o desespero, a tristeza e até a morte, o riso a cavalo e o galope do sonho. É com isso que enfrento essa dura e fascinante tarefa de viver. (Ariano Suassuna)

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O presente artigo tem como objetivo preponderante evidenciar aspectos da magnífica trajetória pluralista do homem público e intelectual Ariano Suassuna. Mesmo considerando a quase impossibilidade de num simples e exiguo espaço como este, materializar tal pretenção.

Uma das mais importantes e conceituadas instituições do Brasil, a Academia Brasileira de Letras, em páginas dedicadas ao evidenciamento da vida e obra do acadêmico Ariano Suassuna, assim retrata aspectos de sua biografia e bibliografia:

Sexto ocupante da Cadeira nº 32, eleito em 3 de agosto de 1989, na sucessão de Genolino Amado e recebido em 9 de agosto de 1990 pelo Acadêmico Marcos Vinicios Vilaça. Faleceu no dia 23 de julho de 2014, no Recife, aos 87 anos. Ariano Vilar Suassuna nasceu em Nossa Senhora das Neves, hoje João Pessoa (PB), em 16 de junho de 1927, filho de Cássia Villar e João Suassuna. No ano seguinte, seu pai deixa o governo da Paraíba e a família passa a morar no sertão, na Fazenda Acauhan. (ABL, 2021).

A ascenção do mencionado escritor à Academia Brasileira de Letras é uma claríssima demonstração do reconhecimento integral desta instituição à riquíssima produção literária, gerada de forma genuína, fecunda, criativa e inovadora, por Ariano Suassuna.

Para que o estimado leitor e leitora possa ter acesso e assimilar a grandiosidade, autenticidade, bem como atualidade, da produção intelectual do escritor referido, optou-se por alicersar-se na sua fidedigna bibliografia, socializada pela Academia Brasileira de Letras, a saber:

Teatro

Uma Mulher Vestida de Sol (1947). Recife: Imprensa Universitária, 1964. Especial da Rede Globo de Televisão, 1994.

Cantam as Harpas de Sião (ou O Desertor de Princesa) (1948). Peça em um ato. Inédita.

Os Homens de Barro (1949). Peça em 3 atos. Inédita.

Auto de João da Cruz (1950). Prêmio Martins Pena. Peça inspirada em três folhetins da literatura de cordel. Inédita.

Torturas de um Coração (1951). Peça para mamulengos.

O Arco Desolado (1952).

O Castigo da Soberba (1953). Entremês popular em um ato.

O Rico Avarento (1954). Entremês popular em um ato.

Auto da Compadecida (1955). Medalha de ouro da Associação Brasileira de Críticos Teatrais. Rio de Janeiro: Livraria Agir, 1957; 34.ª ed., Agir, 1999. Estréia no cinema, 1969. Microssérie da Rede Globo de Televisão, 1994, e no cinema, 2000.

O Desertor de Princesa (Reescritura de Cantam as Harpas de Sião), 1958. Inédita.

O Casamento Suspeitoso (1957). Encenada em São Paulo pela Cia. Sérgio Cardoso. Prêmio Vânia Souto de Carvalho. Recife, Igarassu, 1961. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, junto com O Santo e a Porca; 8.ª ed., 1989.

O Santo e a Porca, imitação nordestina de Plauto (1957). Recife: Imp. Universitária, 1964. Medalha de ouro da Associação Paulista de Críticos Teatrais. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, junto com O Casamento Suspeitoso; 8.ªed., 1989.

O Homem da Vaca e o Poder da Fortuna (1958). Entremês popular.

A Pena e a Lei (1959). Peça em três atos. Premiada no Festival Latino-Americano de Teatro em 1969. Rio de Janeiro: Agir, 1971; 4.ª ed., 1998.

Farsa da Boa Preguiça (1960). Estampas de Zélia Suassuna. Peça em três atos. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974; 2.ª ed., 1979. Episódio de Terça Nobre, Rede Globo de Televisão, 1995.

A Caseira e a Catarina (1962). Peça em um ato. Inédita.

As Conchambranças de Quaderna, 1987. Estréia no Teatro Waldemar de Oliveira, Recife, 1988. Inédita.

A História de Amor de Romeu e Julieta. Suplemento “Mais!”, da Folha de S. Paulo, 1997.

Ficção

A história do amor de Fernando e Isaura. Romance inédito, 1956.

Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta. Romance armorial popular. Nota de Rachel de Queiroz. Posfácio de Maximiano Campos. Rio de Janeiro: Borsoi, 1971. 2.ª ed. Rio: José Olympio, 1972. Adaptação teatral, por Romero de Andrade Lima, 1997.

As Infâncias de Quaderna. Folhetim semanal no Diário de Pernambuco, 1976-77.

História d’O Rei Degolado nas Caatingas do Sertão / Ao Sol da Onça Caetana. Romance armorial e novela romançal brasileira. Com estudo de Idelette Muzart F. dos Santos. Rio de Janeiro: José Olympio, 1977.

Fernando e Isaura. Romance (1956). Recife, Bagaço, 1994.

Outras obras

O Pasto Incendiado (1945-70). Livro inédito de poemas.

Ode. Recife: O Gráfico Amador, 1955.

Coletânea da Poesia Popular Nordestina. Romances do ciclo heróico. Recife: Deca, 1964.

O Movimento Armorial. Recife: UFPe, 1974.

Iniciação à Estética. Recife: UFPe, 1975.

A Onça Castanha e a Ilha Brasil: Uma Reflexão sobre a Cultura Brasileira (tese de livre-docência em História da Cultura Brasileira). Centro de Filosofia e Ciências Humanas, UFPe, 1976.

Sonetos com Mote Alheio. Recife, edição manuscrita e iluminogravada pelo autor, 1980.

Sonetos de Albano Cervonegro. Recife, edição manuscrita e iluminogravada pelo autor, 1985.

Seleta em Prosa e Verso. Estudo, comentários e notas do Prof. Silviano Santiago. Rio de Janeiro: José Olympio / INL, 1974 (coleção Brasil Moço).

Poemas. Seleção, organização e notas de Carlos Newton Júnior. Recife: Universidade Federal de Pernambuco/Editora Universitária, 1999.

CD – Poesia Viva de Ariano Suassuna. Recife: Ancestral, 1998.

Obras traduzidas

Para o alemão

Das Testament de Hundes oder das Spiel von Unserer Lieben Frau der Mitleidvollen (Auto da Compadecida). Tradução de Willy Keller. St. Gallen/Wuppertal: Edition diá, 1986.

Der Stein des Reiches oder die Geschichte des Fürsten vom Blut des Geh-und-kehr-zurück (Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta). Tradução e notas de Georg Rudolf Lind. Sttutgart: Hobbit Presse/Klett-Cotta, 1979; 2.ª ed., 1988.

Para o espanhol

Auto de la Compadecida. Adaptação e tradução de José María Pemán. Madrid: Ediciones Alfil, 1965.

El Santo y la Chancha (O Santo e a Porca). Tradução de Montserrat Mira. Buenos Aires: Losangue, 1966.

Para o francês

Le Jeu de la Miséricordieuse ou Le Testament du chien (Auto da Compadecida). Tradução de Michel Simon. Paris: Gallimard, 1970.

La Pierre du Royaume: version pour européens et brésiliens de bon sens (Romance d’A Pedra do Reino). Tradução de Idelette Muzart Fonseca dos Santos. Paris: Editions Métailié, 1998.

Para o holandês

Het testament van den hond (Auto da compadecida). Tradução de J.J. van den Besselaar. Nederlandse, Ons Leekenspel: Bussum, 1966.

Para o inglês

The Rogue’s Trial (O Santo e a Porca). Tradução de Dillwyn F. Ratcliff. Berkeley/Los Angeles: University of California Press, 1963.

Para o italiano

Auto da Compadecida. Tradução de L. Lotti. Forli: Nuova Compagnia, 1992.

Para o polonês

Historia o milosiernej czyli testament psa (Auto da Compadecida). Tradução de Witold Wojciechowski e Danuta Zmij. Dialog. Rok IV Pazdziernik 1959, NR 10 (42), p. 24-64.

Compreende-se que tão rica e autêntica bibliografia é explicitadora não apenas do imenso talento, inventividade, deste intelectual paraibano, de estatura nacional e internacional, como da dinâmica pluralista e multidimensional de sua produção cultural, que transita pelo teatro, ficção, música, ciência (principalmente Filosofia e Estética), com desenvoltura esplêndida. São inúmeros os estudiosos e pesquisadores, principalmente no Brasil, em todas as macro regiões deste país, bem como no exterior, que se debruçam na investigação e análiseda obra do escritor Ariano Suassuna.

Comprovador desse fato é a existência de dezenas de artigos científicos, monografias, dissertações e teses já apresentadas, defendidas, acima de tudo no âmbito das instituições públicas de Ensino Superior. E, parcialmente socializadas por meios eletrônicos, enfatizando a obra do mencionado. Exemplos deste empreendimento foram realizados por pesquisadores ligados à instituições de Ensino Superior no Brasil e em Portugal: UFC, Unilab, URCA/Universidade do Porto, Unifap, Unicamp, UFMG/IFMG, UFPB/Universidade de Coimbra, UFRN/UFBA; na área de concentração de Literatura Comparada.

Conforme PEREIRA & LIMA (2018, p. 7-8), em sua magistral obra “A ilumiara sob o sol do meio dia”, assim expressa:

Além das perspectivas analíticas, os trabalhos aqui reunidos se irmanam pela origem comum dos corpora: a exuberante criação literária de Ariano Suassuna (1927-2014). Nesse contexto, com o fim de melhor compreender a singularidade dos fios com que Ariano tece sua obra magnífica, os investigadores elegem como objetos de pesquisa as peças Uma mulher vestida de sol (1947), o Auto da Compadecida (1955), A farsa da Boa Preguiça (1960) e O casamento suspeitoso (1957), além dos romances A história de amor de Fernando e Isaura (1956) e O Romance d’a Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta (1971). Observa-se aqui um olhar plural cultural e residual desenvolvido pelos pesquisadores e o projeto escritural do autor celebrado nestas pesquisas. Pois Suassuna, cuja trajetória ficcional foi marcada pela coerência, esmerou-se em manter sempre avivado um diálogo entre tradição e modernidade. A base do seu projeto Armorial, a propósito, se localiza exatamente na criação de uma nova estética a partir da tradição popular, cujas raízes se acham fixadas no medievalismo europeu, e até mesmo além desse período, alcançando a Antiguidade greco-romana. Mais do que isso, Suassuna preocupou-se em recontextualizar toda a matéria colhida nos tempos pretéritos, atualizando os elementos arcaicos nos palcos sertanejos do Nordeste, recriando o passado a partir de uma mentalidade e de um imaginário popular igualmente ricos, prenhes de símbolos e ritos, povoados por personagens fantásticos e orientados por uma ligação muito singular com o sobrenatural. Como veremos aqui, o que resulta desse encontro entre tradição e modernidade e entre popular e erudito mediado pela genialidade de Ariano Suassuna é uma obra que celebra a cultura presente nos folhetos de cordel, na cantoria nordestina e tantas outras criações populares como a fonte mais genuína para a compreensão da brasilidade. Sem concessões à industrial cultural, Ariano Suassuna se faz Quaderna para levar adiante sua mensagem em defesa dessa cultura, reinventando Quixote com sertanejas armas heráldicas e brasões numa travessia mágica das rústicas (mas não menos belas!) paisagens do semiárido.PEREIRA & LIMA (2018, p. 7-8)

Se a obra do escritor aqui enfocado ficasse restrita a esta produção de peças teatrais, de maneira fidedigna e sistematizada, analisada por competentes pesquisadores que compuseram a “A ilumiara sob o sol do meio dia”, já seria extraordinariamente válida, ampla e bela. Tal obra, enquanto construção coletiva, produto de pesquisa com rigor cientício e literário, é essencial e indispensável para todos, quantos queiram compreender os elementos constitutivos da obra de Ariano Suassuna.

As concepções contidas ainda na obra anteriormente citada são muito importantes para que todos nós não caiamos no equívoco de estabelecer, pois, tentativas de enquadramento ou estardização da obra do escritor Ariano Suassuna, negligenciando ou mascarando as sublimes, fecundas e reais fontes em que ele soube transitar para construir conexões originais entre tradição e modernidade, erudito e popular, no processo de produção e socialização de sua obra.

O legado literário desta personalidade emblemática da Literatura Brasileiraé tão imenso, diversificado, e riquíssimo que sua integralidade não comporta evidenciamento em modesto artigo como este, e tantos outros que já foram efetivados e que haverão de continuar sendo formulados.

Dentro desta mesma perspectiva, procedendo pertinente análise da obra “Romance d’A Pedra do Reino e o príncipe do sangue vai e volta”, do anteriormente citado escritor paraibano, ALEIXO (2019 p. 169) deixa claro:

Visivelmente, o Romance d’A Pedra do Reino apresentava os traços do enciclopedismo. Findo o trabalho, reconhece-se: absolutamente, o livro é enciclopédico. Em princípio, porque circunscreve-se a uma nação, cuja imagem se constrói como extensão do Nordeste brasileiro, mais precisamente do Sertão – “o Reino é o Brasil, este Sertão do mundo”. O espaço sertanejo comporta-se como gênese e inspiração para o narrador e para o escritor. Emanam dele os saberes e as práticas dos que ali vivem: as festas, como as cavalhadas, a medicina popular, os cantadores de feira e seus romances, os homens e mulheres do povo com suas profecias, a história oficial mesclada aos causos cotidianos, os mitos, como da Besta Bruzacã, os alimentos típicos, enfim, a paisagem bastante peculiar. Estes são elementos que referenciam e qualificam aquela região específica, que sendo fração do mundo real, entra na diegese da narrativa como representante do todo. Aquele Sertão, desvelado sob suas diversas faces, e seus habitantes revelam-se metonímicos de um Brasil reconhecido por Suassuna como Brasil real, aquele apreendido pelos olhos da cultura popular.ALEIXO (2019 p. 169)

Percebe-se, que para construção de tão engenhosa obra, o escritor paraibano, como poucos no Nordeste Brasileiro, com competência, aptidão e habilidade inequívoca, soube desenvolver amplo processo de investigação do universo cultural inerente a esta região. Para além disso, sua trajetória foi marcada pela incorporação dos reais valores da cultura nordestina e, por extensão, sertaneja. Vivenciou ainda a arte sublime e paciente de escutar e dialogar com vaqueiros, aboiadores, rezadeiras, benzedeiras, violeiros, cantadores populares, teatrólogos, jovens atores e atrizes, cordelistas, camponeses, educandos e educadores, músicos, plateias multifacetadas – espalhadas pelo território nacional, produtores culturais, tanto eruditos quanto populares, e com isto também sedimentou sua rica produção.

É inegável! O que assinala a trajetória do escritor citado é seu compromisso e responsabilidade teórico-prática, permanente, incansável, com a defesa, proteção e promoção da cultura popular, notadamente, nordestina e sertaneja. Soube capturar e reiventar tal universo cultural através de complexo e diversificado processo de pesquisa, ensino e extensão, pois foi também professor do Ensino Superior durante mais de três décadas. Teve a capacidade ainda de residir e vivenciar a cultura nordestina em cidade interiorana desta região. Seu aprendizado cultural sobre a região se desenvolve desde a sua infância e apenas aprofunda-se ao longo de sua vida. O que eleva a sua obra a uma estatura de excelência, e a mantem atual e cultuada.

Elucidando sua contruição à Educação Brasileira, com pertinência, MACHADO (2019, p.1) expõe:

Como professor, Suassuna usou a Literatura, a arte da palavra, a serviço da educação, sob o enfoque discursivo da cultura oral do sertão. Formado em Direito e Filosofia, lecionou por trinta e dois anos na Universidade Federal de Pernambuco, onde ensinou Estética e Teoria do Teatro, Literatura brasileira e História da Cultura brasileira, aplicando sempre a Literatura com as Ciências sociais. Mostrava aos seus discentes que, o conhecimento adquirido no universo literário podia ser uma grande aventura para a transformação da vida em sociedade. Foi ainda Secretário de Educação e Cultura de Recife e Secretário de Cultura no governo Miguel Arraes. Foi um dos maiores responsáveis pela difusão da cultura nordestina, unindo dois elementos até então díspares: o erudito e a cultura popular, com o “Movimento Armorial”. Desenvolveu ainda o projeto “ A Onça malhada, a Favela e o Arraial”, com o qual percorreu as periferias das cidades brasileiras e o sertão, redutos do povo simples do “Brasil real”.MACHADO (2019, p.1)

As afirmações formuladas por esta educadora-pesquisadora comprovam não apenas a inserção do erudito/popular na obra de Ariano Suassuna, como sua inegável contribuição, sistemática, à Educação Brasileira. Enquanto também professor-pesquisador, gerador de valiosas contribuições para evolução do patrimônio educacional-cultural-científico do povo brasileiro. Indicativo também desta sua prática educatica é a produção, por exemplo, de sua obra “Iniciação à Estética”, reveladora, entre outros fatores, do compromisso, responsabilidade e sensibilidade do educador com as aspirações e múltiplas demandas dos seus educandos(as) do Nordeste Brasileiro, principalmente.

No contexto ainda de tal obra, também fica muito transparente o profundo interesse e compreensão do professor Ariano Suassuna sobre os estudos, pesquisas e ensino da Filosofia, que tão bem soube correlacionar com a Estética. Já na abertura da citada obra, SUASSUNA (2012, p. 8-9), de forma didática, explicita:

A iniciação à Estética não se dá sem aquele deslumbramento ante a beleza e a Arte, que não é, senão, uma outra face do deslumbramento ante o mundo que já deve ter despertado, neles, o amor pela Filosofia. Para falar a verdade, qualquer dos quatro ou cinco grandes textos estéticos pode servir para isso, e os estudantes escolherão o seu de acordo com o temperamento e o modo de ver as coisas de cada um. (…) Eu, se aceito verdades parciais, trazidas ao entendimento do mundo, da Beleza e da Arte, pelos pensadores mais diversos, é para incorporá-las ao patrimônio da Filosofia, cuja importância e cuja grandeza não me envergonho de afirmar, num tempo em que todo mundo — sociólogos, psicólogos etc. — parece envergonhar-se da Filosofia em nome da deificação da Ciência. O que, aliás, não parece ter mais muito sentido, quando alguns dos maiores cientistas do século XX proclamam a importância da intuição e do transracional para o conhecimento, sabendo, como sabem, que tanto as grandes criações da Arte e da Literatura, quanto as da Filosofia e da Ciência, partem de um núcleo só, a noite criadora da “vida pré-consciente do intelecto”, para usar uma expressão de Maritain. Assim, o conhecimento é um só, e a Filosofia também é uma só — e é por isso que acho que todos os que trabalham em seu campo têm de deixar de lado o orgulho. Temos de perder a mania de inovar a qualquer preço, de sistematicamente discordar dos pensadores que antecederam o nosso século somente pelo temor de nada dizer de novo. (SUASSUNA, 2012, p. 8-9)

Nesta obra, são explicitadas com fidedignidade as correlações entre Filosofia e Estética. Inclusive, também desenvolvidas através de múltiplos diálogos que seu autor estabele comos principais pensadores clássicos da Filosofia, tão bem conhecidos e cultuados por ele. Para além de interessante e fundamental para seus educandos(as), as concepções de Filosofia e Estética, de forma expressiva, terminaram sendo realizadas na produção literária de Ariano (estão evidencidas em suas peças teatrais, pinturas, xilogravuras, poesias, poemas, ensaios, romances). A obra citada foi estruturada de modo a favorecer com transparência e profundidade a formação de seus educandos(as), e assim foi glabalmente delineada.

Para os leitores(as) realmente interessados na compreensão aprofundada da obra de Ariano Suassuna, sugerimos a leitura de sua vasta e pluralista obra, bem como obras acadêmicas produzidas por educadores/pesquisadores, a saber:

ARAÚJO, Robson Victor da Silva. Da ibéria ao sertão: reminiscências e resíduos ibero-medievais na epopeia paraibana de Ariano Suassuna. 2012. 120f. (Dissertação de Mestrado em História), Programa de Pós-graduação em História, Centro de Humanidades, Universidade Federal de Campina Grande – Paraíba – Brasil, 2012. Disponível em: http://dspace.sti.ufcg.edu.br:8080/jspui/handle/riufcg/2044

BRAGA, Otília Isabel. Uma leitura de A pena e a lei, de Ariano Suassuna. 2007. Disponível em: http://hdl.handle.net/10451/376

DIMITROV, Eduardo. O Brasil dos espertos: uma análise da construção social de Ariano Suassuna como ‘criador e criatura’. São Paulo, 2006. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8134/tde-01102007-143308/pt-br.php

FAVARETTO, Fernando. A literatura de Ariano Suassuna na tv : um estudo de formação estética. 2008. Disponível em: http://hdl.handle.net/10183/13505

GOMES, Aline Aparecida de Souza. O santo e a porca, de Ariano Suassuna: o imaginário do sertão em nova cena. 2010. 94 f. Dissertação (Mestrado em Literatura) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2010. Disponível em: https://tede2.pucsp.br/handle/handle/14931

GONÇALVES, Isabella Albuquerque. Ariano Suassuna, o rapsodo mordestino. 2020. Disponível em: http://hdl.handle.net/1843/34421

MARTINS, Jossefrânia Vieira. O reino encantado do sertão: uma crítica da produção e do fechamento da representação do sertão no romance de Ariano Suassuna. 2011. 208 f. Dissertação (Mestrado em História e Espaços) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2011. Disponível em: https://repositorio.ufrn.br/handle/123456789/16956

SZESZ, Christiane Marques. Uma história intelectual de Ariano Suassuna: leituras e apropriações. 2007. 305 f. Tese (Doutorado em História)-Universidade de Brasília, Brasília, 2007. Disponível em: https://repositorio.unb.br/handle/10482/7600

VIEIRA, Francisco Jacson Martins. A(u)tos matutos de Ariano Suassuna e Aristófanes: – É possível? – Não sei. Só sei que foi assim!. 2019. 124f. – Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Ceará – Programa de Pós-graduação em Letras, Fortaleza (CE), 2019. Disponível em: http://www.repositorio.ufc.br/handle/riufc/41886

VOGADO, Eguimar Simões. Metaficção e história na espiral narrativa de Ariano Suassuna: leitura poético-alegórico do Romance da Pedra do Reino. 2008. 173 f. Tese (doutorado) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara, 2008. Disponível em:http://hdl.handle.net/11449/102418

Considerações finais

Conforme ficou demonstrado no presente artigo, a trajetória e produção intelectual de Ariano Suassuna é multidimensional e de imenso valor filosófico, literário, estético, histórico, sociológico. É por excelência pluralista e está permeada pela riquíssima constituição genuina da cultura popular, bem como da cultura erudita sem geração de dicotomias entre estas. Configura-se ainda como anúncio e denúncia das injustiças sociais históricas, vitimizadoras, principalmente, dos nordestinos e sertanejos.

Ressalte-se ainda que o mencionado homem público e escritor foi um defensor do Estado Democrático de Direito; da democracia; e de todos os demais fundamentos e princípios constitutivos da República Federativa do Brasil, contidos na vigente Constituição de 1988. Protagonizou, acima de tudo através de suas obras, a defesa, proteção e promoção de valores essenciais para a saudável convivência humana: a paz, liberdade, fraternidade, solidariedade, cooperação, honestidade, amizade, justiça social. E foi um aguerrido combatente, muito lúcido, das desigualdades sociais históricas existentes no Brasil.

As alegrias, bem como as dores, potencialidades e limitações do povo brasileiro, crenças, formas de sobrevivência, virtudes e defeitos, esperanças e desesperanças, inventividades, lutas e utopias, compõem também o universo de alguns personagens do escritor. Ariano Suassuna é muito mais que um substantivo. É substância fecunda, corporificada por humanização, manifestação de inconformismo e resistência em relação às práticas sociais produzidas e reproduzidas pela Indústria Cultural através dos meios de comunicação de massa. Sua obra é um reflexo também das adversidades e injustiças que vitimaram, por exemplo, o seu querido pai e outros membros de sua expressiva família. Assim, possui, inquestionavelmente, a validade de contribuir para o fortalecimento da identidade cultural do povo brasileiro. Continua atual e precisa ser cada vez mais refletida, em múltiplos espaços sociais, em todo o território nacional. E, acima de tudo, no contexto das escolas de Ensino Fundamental e Médio do País. Seu legado é para as presentes e futuras gerações. Que conquistemos a irresoluta capacidade evolutiva de defendê-la, protegê-la e promovê-la, como patrimônio autêntico da cultura nacional.

Viva Ariano Suassuna! Ariano Suassuna vive e viverá!

Referências:

ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS (ABL). Ariano Suassuna: bibliografia. Disponível em:https://is.gd/XZ8lQL Acesso em: 26/09/2021.

ALEIXO, Sandra Elis. O romance d’A Pedra do Reino e o príncipe do sangue vai-e-volta como narrativa enciclopédica: saberes e práticas de uma cultura. Curitiba: UFPR, 2019 (p. 169). Disponível em:https://is.gd/TtBINtAcesso em: 26/09/2021.

MACHADO, Aurea Maria Bezerra Machado. Ariano Suassuna: a escrita e a prática de um pensamento educacional no “Brasil real”. 30° Simpósio Nacional de História. Recife, 2019 (p.1). Disponível em:https://is.gd/eApdG6 Acesso em: 26/09/2021.

PEREIRA, Marcos Paulo Torres; LIMA, Francisco Wellington Rodrigues (Org.). A ilumiara sob o sol do meio dia: estudos sobre a obra de Ariano Suassuna. Macapá: UNIFAP, 2018(p. 7-8). Disponível em:https://is.gd/42BnFm Acesso em: 26/09/2021.

SUASSUNA, Ariano. Introdução a Estética. 12ª edição. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2012 (p. 8-9).

Por: Giovanny de Sousa Lima