Acrônico

Por: Francisco Jarismar de Oliveira 

“Por muito tempo você viverá e voará alto
E sorrisos você dará e lágrimas você irá chorar
E tudo o que você toca e tudo o que vê
É tudo o que sua vida sempre será”
(Time – Pink Floyd)

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Em 24 de março de 1973 chegava às lojas de Londres, no Reino Unido, o LP The DarkSideOfThe Moon da banda inglesa Pink Floyd. Enquanto isso, do outro lado do planeta, nas coordenadas geográficas 7°07’15.0″S 38°30’07.0″W, cruzamento da rua Malaquias Gomes Barbosa com a rua Prefeito Joaquim Assis, na Maternidade “Ana Lacerda” em São José de Piranhas, na madrugada daquele sábado, reencarnava este colunista.

A partir daquele momento e com a trilha sonora floydiana a ecoar nos ouvidos dos habitantes do planeta terra, começava a aventura de uma vida que já dura meio século. Costumo dizer aos amigos que a trilha sonora foi uma condição minha para a reencarnação – como se tivesse eu alguma autoridade para tanto, mas o fascínio e a companhia das melodias do disco já me acompanham há cinco décadas.

O oitavo disco da banda Pink Floyd é uma suite de rock progressivo, desenvolvida de forma ininterrupta, em uma alucinante viagem de 42 minutos que começa e termina ao o som do pulsar de um coração. Já na capa, com arte do designer Storm Thorgerson, temos uma metáfora visual da evolução espiritual da criatura humana, ou seja, um raio monocromático ascendente que evolui a uma multiplicidade de cores. Em nossa trajetória a vida foi e vai se descobrindo em uma expansão de cores à medida que transpomos os dias. Quanto ao lado escuro todos temos uma espécie de loucura reservada, protegida e não revelada às outras pessoas.

As tristes e pesadas canções versam sobre insanidade mental, morte e a maçante ganância em vida. De monólito inescrutável à trilha sonora da minha vida, os conceitos trabalhados de tempo, dinheiro, cobiça, drogas e misérias humanas se encaixam perfeitamente em cada etapa da existência, desde a estreia até o cortineiro esconder do palco a plateia.

As faixas SpeakTo Me e Breathe traduzem, com melodiosa contundência, a miserabilidade da missão humana na Terra. Os versos “Respire, inale o ar. Não tenha medo de se preocupar. Vá, mas não me deixe. Dê uma olhada por aí, escolha seu próprio chão”, retratam a largada para a vida carnal que se inicia tutelada, a princípio, pelos progenitores.

The DarkSideOf The Moon compulsa com a desilusão, o medo, o ressentimento, a obsessão. É retesado e perturbador para os corações e mentes mais cordeiros. As músicas On The Rune  AnyColourYou Like flertam, inconsequente e deliberadamente, com o tema das drogas e da loucura em uma experiência psicodélica etérea. Para além, no desmantelo das ingênuas esperanças que vão ficando pelo caminho, em BrainDamage sucumbimos a um desajuste mental: “O lunático está na minha cabeça” é a frase mestra denunciando as alienações ideológicas e fóbicas da meia idade.

A vida não passa de uma “corrida para uma morte precoce”. Nas baquetas de Nick Mason e na letra de Time temos o desmonte da mais ingênua das nossas ilusões:

“E você corre e corre para estar junto ao sol, mas ele está se pondo.

E gira ao redor para vir atrás de você novamente.

O sol é o mesmo de uma forma relativa, mas você está mais velho.

Com menos fôlego e um dia mais próximo da morte.”

 The GreatGigIn The Sky nos reitera o inevitável “- Você tem que ir algum dia.” Nessa faixa o piano de Richard Wright e o vocal da cantora Clare Torrynos arrebata para uma viagem insólita em que cada um é que sabe aonde foi e o que trouxe na volta. Depois vem Money decodificandoo desastre que o dinheiro pode causar – e causa – na trajetória humana para, logo em seguida, nos lançar no baqueda intemporalUs andThem, com seu pranto às segregações humanas e suas decorrentes mazelas expostas. Nós e eles, melodicamente suave e explosiva, traduz o abismo material e a indiferença amalgamados na civilização.

A última faixa do álbum, Eclipse, vem translucidar parte da escuridão em que estamos mergulhados – “Tudo o que é agora e tudo o que se foi / E tudo o que está por vir e tudo sob o sol está em sintonia” – porém,  “o sol é eclipsado pela lua.” E encerra “Não há lado escuro da lua, na verdade… ela é toda escura.”Finda a ilusão.

De forma severa e intolerante os grandes dramas da existência: guerra, tempo, dinheiro, vida cotidiana e a morte inevitável são reverberados em uma perspectiva desconfortavelmente áspera e direta nas letras de Roger Waters e com o insigne timbre da extratosférica guitarra de David Gilmour.

A obra The DarkSideOf The Moon é um regozijo com toda a alienação, todas as futilidades, imbecilidades, ignorâncias, todos os medos, todas as sombras e todos os desesperos do homo sapiens. Ouça o disco, contudo evite os excessos. Depois dos 50 o equilíbrio é a chave.

Francisco Jarismar de Oliveira (Mazinho) — Mestre em Ensino pela UERN. Licenciado em História pela UFCG; Especialista em Informática em Educação pela UFLA e Servidor Público Federal do IFPB.