Jesus discursando no Congresso Nacional

Imagino que se Jesus retornasse ao nosso convívio, em carne e osso, para uma breve visita ao Brasil, poderia, quem sabe, ir ao Congresso Nacional para proferir um grande discurso profético, dirigido aos deputados e senadores que compõem aquela Casa.

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Não resta dúvida, seu discurso seria contundente, inflamado, profético, carregado de anátemas. E qual seria o teor do discurso desse filho amado de Deus? Quem seriam seus ouvintes? Quais seriam as imediatas reações? O que iriam fazer com Jesus de Nazaré, após seu inflamado pronunciamento? Seria aplaudido de pé, ou expulso pelos homens e mulheres do poder, após perceberem que seu status quo fora questionado, julgado e condenado moralmente?

Vejamos como seria o discurso de Jesus, o defensor incondicional dos injustiçados, dos excluídos, dos marginalizados, dos sem vida, dos sem dignidade, dos massacrados pela cultura maldita da injustiça social:
Senhores e senhoras, meu cordial boa tarde

Vim a esta casa em missão de paz. E nesta missão de paz, quero lançar meu grito profético. Espero ser compreendido. Sei das graves consequências que cairão sobre mim. Estou consciente da reação negativa de muitos de vocês. Mas não temerei, porque minha missão é libertadora, é salvífica.

Como os senhores e as senhoras sabem, eu vim a este mundo para que todos tenham vida e a tenham em abundância. É nessa direção que farei o meu pronunciamento. Serei breve, objetivo. A minha linguagem será a linguagem do povo sofredor, que tantas vezes é ignorado ou tratado com desdém por vossas excelências. Então, desculpem-me pela informalidade.
Senhores e senhoras

Olho para esta casa e só vejo luxo e mais luxo, a começar por vocês com suas roupas e calçados caríssimos. Percebo que neste lugar reinam o luxo, a vaidade e a sede pelo poder. Aliás, me perdi dentro deste recinto. Quase que não chegava até aqui. Penso que aqui, pobre não entra. Ora, obrigaram-me a vestir um paletó e por uma gravata.
Quanta a mordomia, ao luxo, lembrem-se das palavras de São Basílio:

“O pão que para ti sobra é o pão do faminto. A roupa que guardas mofando é a roupa de quem está nu. Os sapatos que não usas são os sapatos dos que andam descalços. O dinheiro que escondes é o dinheiro do pobre. As obras de caridade que não praticas são outras tantas injustiças que cometes. Quem acumula mais que o necessário pratica crime” (São Basílio, 330-379; Comentário a Mateus 25,31-46).
Nesta casa, os senhores e as senhoras falam em mim, fazem orações e louvores, mas vivem na contramão do meu evangelho. A fé de vocês é inócua, uma fé alienante, reacionária. Hipócritas, fariseus! Tenho pavor a esses louvores e orações que vocês fazem. Esse bla-bla-bá de vocês não chega aos meus ouvidos.

Vocês desrespeitam o crucifixo que está sobre suas cabeças. Não me levam em consideração. Têm a minha imagem somente como decoração. Vocês são hipócritas. Melhor seria retirar meu retrato dessa parede. Seria um grande respeito a mim e ao meu povo, tantas vezes crucificado pelos senhores e senhoras. Vendo-me pregado na cruz, ainda não entenderam o porquê da minha morte? Não entenderam a minha mensagem de libertação e salvação? Vocês sabem, por acaso, por que me mataram? Qual o motivo do meu assassinato? Sabem quem me matou?

Entendam-me, por favor. Essa minha imagem, pendurada sobre a cabeça dos senhores e senhoras, representa o meu povo sofrido, que clama por vida, justiça social, dignidade. Então, se vocês nada fazem pelo povo, está na cara que vossas excelências não me amam de verdade, a não ser da boca pra fora. Vou repetir o que eu falara há dois mil anos: este povo me honra com os lábios, mas seu coração está longe de mim (15,8). Ah, detesto hipocrisia!

Aqui, há deputados e senadores riquíssimos, não sabem o que possuem, que estão voltados de corpo e alma para seus próprios interesses, seus projetos pessoais, e que o povo se dane. Muitos de vocês só pensam em três coisas: poder, prazer e ter. Lembrem-se das minhas palavras consignadas no Evangelho: “é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino dos céus” (Mt 19:24).

Por que, senhores e senhoras, vocês dispõem de tantas regalias, tantas mordomias? Passagens aéreas, auxílio moradia, verba de gabinete, verba indenizatória, cota parlamentar, verbas paletó, verba pra isso, verba pra aquilo etc., sem contar com os carros de luxo e os altos salários. O que vocês ganham por mês é um absurdo. É muito dinheiro no bolso dos senhores e senhoras. Vocês não acham que isso é uma verdadeira afronta ao povo que luta noite e dia para ganhar o pão de cada dia?

Quanta a mordomia, ao luxo, ao esbanjamento, lembrem-se das palavras de São Basílio:
“O pão que para ti sobra é o pão do faminto. A roupa que guardas mofando é a roupa de quem está nu. Os sapatos que não usas são os sapatos dos que andam descalços. O dinheiro que escondes é o dinheiro do pobre. As obras de caridade que não praticas são outras tantas injustiças que cometes. Quem acumula mais que o necessário pratica crime” (São Basílio, 330-379; Comentário a Mateus 25,31-46).

Senhor presidente desta Câmara de deputados, fui informado de que suas atitudes são antidemocráticas, anti-povo, anti-constituição. Você não acha que isso não é uma grande contradição para quem vive orando,louvando,falando em mim em cultos, celebrações? Enchem a boca com o nome do meu Pai, mas vive na contramão dos princípios democráticos. Deixe de hipocrisia! Aliás, ouvi dizer que você tem a mania de ser golpista, é verdade?

Tem mais, senhor presidente, sua postura autoritária, ditatorial, é inaceitável. Essa sua maneira de presidir vai de encontro a sua fé cristã, a ética cristã. Converta-se para tornar-se uma autoridade exemplar e referência politica e moral para o povo brasileiro.

Este lugar tornou-se podre, fétido, com as ações perversas de tantos. Muitos vivem acusações, difamações, calúnias etc. Onde está o respeito pelo o outro? Onde está a civilidade, a cordialidade?
Vocês deputados, o que estão fazendo pelo seu povo, lá nos seus estados? Têm feito algo em defesa dos sem terra, dos sem teto, dos desempregados, dos sem vez e voz? Por que muitos daqui têm ojeriza aos movimentos sociais? Por que tentam, a todo custo, criminalizá-los?

Senhores e senhoras, trabalhem pensando no povo, no seu bem-estar. Sejam coerentes com seus projetos políticos. Lutem para levar para seus estados benefícios na área da saúde, educação, segurança, moradia etc. Sejam autênticos, sinceros com seus mandatos. Honrem seus mandatos. Não abandone o povo, lembrando-se deles somente em tempo de eleições. Ouçam o que diz o profeta Zacarias:
“Ai do pastor imprestável! Ai do pastor que abandona o rebanho que lhe foi confiado! Que a espada da justiça fira o seu braço, e fure o seu olho direito! Eis que seu braço secará por inteiro, e o seu olho direito ficará completamente em trevas!”( Zacarias 11:17).

Aqui no Senado, há senadores latifundiários. Então a pergunta: por que vocês, que são tão ricos, por que têm raiva do MST? Por que não se preocupam com tantas pessoas que não têm um pedaço de chão para trabalhar? Para que tanto apego, tanto acúmulo? Uma coisa e’ certa: vocês vão morrer, morrendo, vão prestar conta ao meu Pai. Vocês serão julgados duramente, severamente. Ah, para os nobres senhores e senhoras, vale este salmo 48(49):
Por que temer os que confiam nas riquezas *
e se gloriam na abundância de seus bens?
– Ninguém se livra de sua morte por dinheiro *. E mais: – Não dura muito o homem rico e poderoso; *
é semelhante ao gado gordo que se abate.

Muitas vezes vocês, no auge do poder, aprovam projetos que não coadunam com a moral cristã, com os desígnios de Deus, com seu plano criador, mas se dizem cristãos, inclusive frequentando cultos e missas. Quanta contradição, hein?

Muito de vocês, que se dizem cristãos e democráticos, vivem querendo passar o rolo compressor em cima das políticas públicas que visam melhorar a vida do povo pobre do Brasil. Por quê? Por que são contra o bolsa família, o mais médicos?

Desçam do pedestal do poder, escutem a voz rouca da rua, dando-lhe atenção devida. Aliás, vocês estão aqui para servir ao povo, para estar com o povo, caminhar com o povo. Sem o povo vocês não estariam aqui. Não é verdade?

São muitos os que dizem católicos, rezam e recebem a Eucaristia, mas andam na contramão da Igreja no Brasil, quando aprovam vergonhosamente a redução da maioridade penal? Isso é um prova cabal que vocês não dão a devida atenção às posições CNBB. Por que não abandonam logo a Igreja? Vocês são contraditórios.

Vou repetir o que falei no início do meu discurso: nesta Casa, o luxo reina. Nunca vi tanto luxo, nem nos palácios do império romano, quando eu andava pelo mundo. Enquanto isso, milhares de pessoas não têm onde morar, a não ser na rua, nas calçadas, nas praças, debaixo de pontes etc. Isso é justo, é humano? Onde está a consciência cristã de você?

Senhores e senhoras, cadê a reforma politica, tão propalada, tão sonhada pelo povo brasileiro? O que vocês estão fazendo é uma vergonha, uma afronta ao povo. Não se trata de reforma, mas de deforma. Vejam só a questão da doação de empresas privadas para as campanhas eleitorais. Vocês usaram de toda astucia ou malabarismo sujo para aprovar essa cláusula. Então, a corrupção vai continuar. Não é isso que vocês querem? Confesso que é um absurdo, uma vergonha nacional. É, em síntese, uma ofensa a Deus e ao povo do seu país.

Senhores e senhoras desta Casa, abominem a corrupção, a praga do nepotismo, a mentira, a falácia, a enganação, a, as vaidades, o apego ao poder pelo poder. Abandonem a pratica da injustiça, da insensibilidade. Sejam justos, honestos, trabalhadores e coerentes com suas propostas político-partidárias.

Para concluir, peço-lhes, mais uma vez: se não mudarem as atitudes mesquinhas, antidemocráticas, anti-constituição, anti-povo, que retirem o meu crucifico que está sobre suas cabeças, porque é uma afronta a minha memoria martirial, alias, saibam que me mataram porque coloquei-me do lado dos pequenos, dos indefesos, dos injustiçados, dos sem vez e voz. Sigam-me meu exemplo, e só assim ouvirei as suas orações e ficarei feliz com os seus louvores e palmas.
Concluo meu humilde pronunciamento com as bem-aventuranças:
Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus;
Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados;
Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra;
Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos;
Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia;
Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus;
Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus;
Bem-aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus;
Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa (Mateus 5:3-11).
Meu recado profético está dado. Quem tem ouvido ouça.
Muito obrigado pela atenção.

Padre Djacy Brasileiro, em 08 de julho de 2015.
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